Tecnologia e Ciência

Como o 5G vai mudar o mundo

Nova geração da telefonia celular promete revolucionar as cidades – e, de quebra, acabar com os limites de dados nos smartphones. Veja por quê

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Eram dez da noite, estava escuro, e a desempregada Elaine Herzberg, de 49 anos, resolveu atravessar uma avenida em Tempe, cidade de 160 mil habitantes no sul dos EUA. Ela estava fora da faixa, o sinal estava aberto para os carros, e logo aconteceu o pior. Elaine foi atropelada por um Volvo XC90, de 2.000 quilos, a 61 km/h. Morreu no ato. Seria apenas mais uma vítima do trânsito, não fosse por um motivo: um robô estava dirigindo o veículo. Elaine foi a primeira pedestre morta por um carro autônomo. Eles provavelmente vão atropelar mais pessoas. E, toda vez que isso acontecer, a opinião pública ficará assustada (o Uber, dono do carro que matou Elaine, interrompeu seus testes após o acidente). Mas já existe uma tecnologia que promete erradicar os acidentes com veículos autônomos, e mudar outros aspectos da sua vida: a quinta geração da telefonia celular, ou 5G.

– (Marcus Penna /Superinteressante)

Ela é tão importante que o governo dos EUA chegou a cogitar a construção de uma rede 5G estatal, só para não ficar atrás dos chineses (que vão inaugurar a sua no final deste ano). As operadoras americanas se mexeram, e agora prometem montar redes 5G em 30 cidades do país até dezembro – antes mesmo dos celulares compatíveis com essa tecnologia, que só vão começar a chegar ao mercado ano que vem.

A grande novidade das redes 5G é que elas trabalham em frequências mais altas, ou seja, nas quais as ondas eletromagnéticas oscilam mais vezes por segundo. Graças a isso, o 5G promete três vantagens: mais velocidade, maior número de conexões e menor latência.

“A conexão pode perfeitamente atingir 20 ou 30 gigabits por segundo”, afirma Vinicius Dalbem, vice-presidente de estratégia da Ericsson. Seria o suficiente para baixar um filme inteiro, na resolução Ultra HD (4K), em três segundos. Na prática, a velocidade será menor: 10 gigabits por segundo (ou menos, dependendo do que cada operadora decidir). De toda forma, o 5G será muito mais veloz do que as redes 4G atuais. Isso é ótimo, mas não o mais importante.

Talvez você já tenha ouvido falar da chamada “internet das coisas”, que vai conectar todos os objetos do dia a dia – da geladeira da sua casa às lâmpadas da rua. Hoje isso soa meio bobo, mas vai acabar transformando o mundo. Quando todo carro tiver sua própria conexão à internet, por exemplo, poderá se comunicar automaticamente com os outros veículos, com os semáforos e com os celulares nos bolsos das pessoas. E aí, em vez de usar sensores e radares para tentar enxergar os obstáculos e reagir a eles, como acontece hoje, os veículos autônomos saberão as posições reais de todas as coisas.

O 5G transmite com maior velocidade e menor latência (tempo que cada ponto da rede leva para repassar os dados).

– (Estúdio Nono/Superinteressante)

Isso só é possível com o 5G, pois ele suporta uma enorme quantidade de conexões simultâneas: aguenta até 1 milhão de aparelhos a cada km2 de área (dez vezes a capacidade da tecnologia 4G). No bairro paulistano de Pinheiros, por exemplo, poderia haver até 8 milhões de conexões simultâneas – ou 133 dispositivos por habitante.

A terceira novidade das redes 5G é a baixa latência, ou seja, o tempo que cada antena ou ponto da rede leva para processar –e, se for o caso, repassar– os dados. As ondas eletromagnéticas usadas para transmitir informações (seja no 5G, no Wi-Fi, ou em qualquer outra rede sem fio) viajam sempre na mesma velocidade: a da luz. Mas, na prática, a transmissão de dados sempre é mais lenta. Nas redes 4G, a latência é 50 milissegundos (0,05 s). Parece pouco, mas não é: uma informação que fosse recebida e retransmitida por dez carros, por exemplo, só chegaria ao último deles 1 s depois do primeiro. Acidente na certa. Na tecnologia 5G, a latência é 50 vezes menor. A transmissão é praticamente instantânea – e isso abre várias possibilidades.

Mas talvez o benefício mais imediato de todos seja o fim das franquias de dados (aquela quantidade, geralmente 2 a 4 GB, que você pode usar por mês). A capacidade da rede 5G é tão enorme que as operadoras poderão oferecer planos sem limite de dados – e você poderá usar seu celular à vontade, como hoje usa a internet da sua casa. Isso é tão revolucionário quanto a mudança das conexões dial-up para a banda larga, no começo dos anos 2000.

O 5G vai mudar o mundo. Mas terá de passar por alguns obstáculos para chegar ao Brasil. E não são pequenos.

O sistema opera em frequência mais alta, e por isso tem maior capacidade de transmissão de dados.

– (Estúdio Nono/Superinteressante)

1. Os celulares 4G, que temos hoje, operam na frequência de 2,5 GHz. Ou seja: eles emitem e recebem ondas eletromagnéticas que oscilam 2,5 bilhões de vezes por segundo.

2. O seu celular e as redes com as quais ele se comunica manipulam a amplitude dessas ondas para representar os dados que serão transmitidos.

– (Estúdio Nono/Superinteressante)

3. A rede 5G opera em frequências bem mais altas: 3,5 GHz a 40 GHz. As ondas oscilam mais vezes a cada segundo – e, por isso, dá para transmitir mais dados.

4. O sistema também usa vários “canais de dados” (subfrequências) ao mesmo tempo. Cada celular poderá ter até 256 microantenas operando simultaneamente – o que multiplicará a velocidade de transmissão.

“É muito difícil, nas condições atuais, a gente cravar uma data”, afirma André Sarcinelli, diretor de engenharia da Claro. A operadora, bem como suas rivais Tim e Vivo, vê com cautela a chegada da tecnologia ao Brasil – que, segundo estimativas do mercado, pode só ocorrer entre 2020 e 2022. Há dois motivos.

O primeiro é dinheiro. O 5G só alcança a velocidade máxima se a operadora usar frequências de transmissão bem altas. Só que isso diminui muito o alcance do sinal. “Nas frequências mais elevadas, de 26 a 40 GHz, cada transmissor cobre uma área de 100 a 300 metros, no máximo”, explica Agostinho Linhares, gerente da Anatel. Resultado: as operadoras teriam de instalar até 10 vezes mais antenas do que hoje, a um custo altíssimo. Por isso, nos EUA e na China, o 5G vai começar operando numa frequência mais baixa.

No Brasil, as operadoras pretendem fazer o mesmo, e usar a frequência de 3,5 GHz. Elas vão comprar o direito de usar essa frequência num leilão, que a Anatel deve fazer em 2019. Mas há um porém. A tal frequência é vizinha da chamada “banda C estendida”, hoje usada para transmitir TV aberta via satélite. Para evitar interferência, antes de inaugurar o 5G seria necessário instalar filtros nas casas que têm parabólica, um trabalho e tanto (são 20 milhões de residências, e boa parte precisaria do tal filtro).

Em suma: por aqui, o 5G vai demorar. E, quando chegar, talvez seja sem sua promessa mais tentadora, o fim dos limites mensais de dados. “Se o consumo de dados continuar crescendo como hoje, não ter limite é muito difícil”, diz Átila Branco, diretor de planejamento da Vivo. Claro e Tim adotam a mesma postura. Não é impossível que elas venham a oferecer planos ilimitados – em 2017, a operadora americana Verizon fez isso no seu 4G, e logo foi copiada pelas rivais Sprint e AT&T. O maior desafio, como frequentemente acontece, não é tecnológico. É econômico.

Rede ultraveloz e instantânea permitirá conectar coisas que hoje estão isoladas – e deixará as cidades mais inteligentes.

– (Marcus Penna /Superinteressante)

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