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Covid trouxe medo da morte e fez mãe escrever diário para o filho

Após perder uma amiga e ficar aterrorizada com a pandemia, Thaíssa fez recordações em vida para aliviar temor

Thaíssa é a acadêmica de enfermagem e mãe de Oliver, menininho de 2 anos (Foto: Arquivo Pessoal) Thaíssa é a acadêmica de enfermagem e mãe de Oliver, menininho de 2 anos (Foto: Arquivo Pessoal)

Antes da pandemia ser anunciada por aqui, Thaíssa de Lima Neves, 24 anos, vivenciou a perda de uma grande amiga em um acidente de carro. Madrinha de seu casamento, Valquíria deixou para trás marido e um filho pequeno, e isso deixou marcas profundas.

Quando a covid-19 passou a assustar e pessoas começaram a perder a vida, um medo avassalador invadiu Thaíssa. Pensando no filho de 2 anos, Oliver, e como ele recordaria da mãe se algo acontecesse, ela colocou nas palavras os momentos felizes e de amor até então vividos, em um diário cheio de boas lembranças. Só assim conseguiu encarar seu temor da morte: escrevendo uma coletânea da própria vida.

"Estou mais leve – até minha fé aumentou! Pode parecer clichê, mas aproveito cada momento como se fosse o último. A gente não sabe o dia de amanhã, ainda mais na situação que vivemos. Depois de ter começado a escrever o diário, me sinto mais motivada, principalmente por estar viva, presente na vida do meu filho e podendo tecer mais e mais memórias conjuntas", afirma.

Thaíssa só pensava no que a amiga poderia ter deixado em vida de recordação ao filho.

"Ele era tão pequeno, será que lembraria dela e de todo o seu esforço para criá-lo? Foi quando eu mesma comecei com o diário, uma prova física para que o meu próprio filho soubesse o quanto sua presença é importante na minha vida".

Na mesma época em que Valquíria morreu e a pandemia de covid atingiu o globo por completo, Oliver precisou fazer uma cirurgia às pressas para recuperar o rim direito.

"Senti um pânico terrível. Primeiro temendo a vida de meu filho; segundo, dele sair dessa mas ser contaminado pelo vírus ainda no hospital, agravando toda sua situação. Foram momentos difíceis!", relembra.

Oliver sobreviveu, assim como Thaíssa pôde vivenciar novos dias ao lado do filho. Mesmo adaptada à nova realidade e com maior conhecimento sobre a pandemia, a ansiedade vez ou outra bate na porta, e ela aproveita para escrever no livrinho de recordações: "minha bula diária de esperança", garante.

E o que Thaíssa deixa de recado?

"Escrevo momentos marcantes, relatos nossas aventuras, faço recorte e colagens de fotos, prego cliques no estilo Polaroid e anoto as datas embaixo… enfim, uma caixinha de lembrança sobre mim, sobre nós, ao seu futuro", conta.

Fazendo isso, Thaíssa não somente começou a se sentir mais conectada com a vida, mas tecendo uma opinião diferente com relação à morte.

"Troquei o medo por amar cada dia como se não houvesse amanhã, sem se preocupar com a opinião dos outros. Também pude expressar mais os meus sentimentos. Falar da morte é também falar da vida, e vice-versa. Todo mundo vive, todo mundo morre. O que é triste é que a covid-19 já soma muitas e muitas perdas. Espero que as pessoas consigam encarar isso de uma forma que não tire o brilho da vida", reflete.

Incentivada por uma outra amiga, Thaíssa acabou transformando seu talento para o manual em fonte de renda. Por meio da lojinha virtual e papelaria Recordar em Caixa, ela comercializa produtos para que as pessoas também possam usar como presente-recordação.

"Como eu já tinha feito os meus próprios diários em capa dura, comecei a fazer scrapbooks, agendas, planners e cadernos devocionais. Tudo personalizado e feito a mão de uma forma que a pessoa utilize no seu dia a dia mas também possa lembrar e ser lembrada. Por isto o nome 'Recordar em Caixa'. Quero que as pessoas também possam colocar em suas caixinhas lembranças especiais", ressalta.

E finaliza: "a gente não precisa deixar um legado ao mundo, mas só de estar ao lado daqueles que amamos, mostrar que importam e ainda escrever um recadinho para eles já é mais que o suficiente".

 

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