Lucineia Tereza de Jesus faz parte das pessoas que procuraram ajuda policial para conhecer suas origens
Olhando para cima, se esforçando para resumir longos 17 anos de espera e investigação, Lucineia Tereza de Jesus tenta encontrar os caminhos para narrar como ter descoberto quem é sua mãe biológica ainda a afeta, quatro anos depois do encontro. Querendo construir uma história como a de Neia, cerca de 12 mil pessoas procuraram a Polícia Civil em Mato Grosso do Sul para conhecer sua família “perdida”.
“Desencontro é quando a pessoa não conhece, por exemplo, pai e mãe biológicos e quer descobrir. Também é quando há muitos anos, cerca de 40 a 60 anos, não se encontram”. As palavras são da investigadora da 5ª Delegacia de Polícia Civil, Maria Campos, que explica sobre o alto número de pessoas querendo descobrir o início de suas histórias.
Especialista em desaparecimento de pessoas, a investigadora aponta Neia como uma das pessoas que pediu ajuda da polícia e teve sucesso após muito esforço aplicado.
Hoje com 40 anos, Lucineia explica que resolveu ir atrás de sua mãe biológica após atingir a maioridade, “fui na Depac (Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário) perto de uma data comemorativa e contei minha história para a Maria Campos. Não encontramos minha mãe logo de cara, primeiro foram outros familiares”, disse.
Na verdade, nada foi “logo de cara” na trajetória de buscas envolvendo Lucineia. Conforme relatado por ela, demoraram quatro anos até que a investigadora encontrasse os primeiros familiares e mais 13 até encontrar a mãe biológica.
Até hoje quando conto a história as pessoas às vezes não acreditam porque demorou muito tempo. Eu falo para quem também está procurando que não desista, que continue insistindo. Precisa insistir", defende Neia.
Após encontrar a primeira tia e prima, Lucineia explica que continuou “no pé” da Polícia Civil para manter a história caminhando e acasos ajudaram a trajetória. “Eu entrei em uma escola de samba e a Maria Campos participava da diretoria. Sempre via ela e comecei a criar um vínculo maior, mantendo muita cobrança”, brinca.
Anos depois, foi justamente na escola de samba que Lucineia encontrou Isabel, sua mãe biológica. "A investigadora conseguiu encontrar ela no interior de São Paulo e levou para me conhecer lá. Foi um chororô, eu estava grávida da minha segunda filha. Eu chorando, minha mãe chorando e a chuva super forte caindo. Ela ficou aqui na minha casa e desde então mantemos contato", conta.
Mar de mistérios - “Hoje eu estou mais tranquila, tenho convívio com minha mãe biológica e minhas irmãs. Ainda é um mar de mistérios, tem coisas que não consegui descobrir, mas não me arrependo de todo esse tempo aplicado”, Neia explica.
De acordo com Lucineia, a investigação foi tão trabalhosa porque sua mãe biológica não mora mais em Campo Grande e não havia mantido contato com parentes. “Ninguém sabia dela, eles só voltaram a ter contato depois que a gente conseguiu fazer o encontro em 2017. Ela morava no interior de São Paulo, então foi difícil”.
Minha mãe, que me adotou, disse que eu estava doente quando a Isabel [mãe biológica] saiu de casa. Fiquei internada no hospital e ela não tinha condições de me cuidar. Minha tia falou para a minha mãe que tinha uma mulher querendo dar a menina dela para adoção, então minha mãe disse que me queria. Ela já tinha dois filhos homens e sonhava em ter uma menina", conta.
Sobre os últimos quatro anos, Neia resume que conseguir contar sua narrativa trouxe a possibilidade de seguir novos caminhos. “Eu queria saber quem minha mãe era, foi difícil esperar, pensei em desistir várias vezes. Mas a encontrei e agora ainda tem coisas para eu descobrir, mas é algo incrível”.
Muita gente - Se debruçando sobre histórias como a de Lucineia, a investigadora Maria Campos explica que o final nem sempre é feliz. “Às vezes procuramos por um longo tempo e quando chegamos às respostas, os pais podem já não estar vivos. Temos investigações que demoram pouco tempo, enquanto outras histórias levam anos”.
A dificuldade aumenta conforme a falta de informações é maior, de acordo com Campos. “Se a pessoa tem o nome dos pais, tem alguma informação sobre parentes, fica mais tranquilo. Mas também tentamos e vamos atrás mesmo sem esses dados, investigamos sim”, explica.
Além da busca por pais e mães, a investigadora também procura outros familiares, como duas irmãs que se encontraram em março deste ano.
Campos relata que em Mato Grosso do Sul, as regiões com maior número de pedidos são Corumbá, Miranda e Aquidauana. “Além dos pedidos aqui no Estado, também recebemos solicitações de todo o Brasil e, em alguns casos, internacionais. Um rapaz que está na Angola quer encontrar a família que está no Brasil, então estamos tentando aplicar nossos métodos para investigar”.
Para descobrir as narrativas, Maria relata que muito tempo é passado entre fichas de maternidades e documentos que façam a ligação entre os personagens. Ligações para possíveis parentes são feitas e toda ajuda possível é requisitada.
De acordo com a investigadora, o trabalho é complexo e, por isso, o jeito é manter a insistência em ação.
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