Hoje tem início a Semana Santa quando teremos a graça de reviver na liturgia o caminho de Jesus, assim descrito por São Paulo: "Ele, existindo na condição divina, não se apegou à condição divina, mas despojou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo, tornando-se igual aos homens.
Vivendo como os outros homens, humilhou-se, fazendo-se obediente até à morte e morte de cruz. Por isso Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o Nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus, todo joelho se dobre no céu, na terra e abaixo da terra, e toda língua confesse: "Jesus Cristo é o Senhor", para a glória de Deus Pai" (Flp 2,6-11).
O Papa João Paulo II, em sua Carta Apostólica "No Início do Novo Milênio", assim explicitou o sentido da paixão de Jesus: revelar-nos o rosto do Pai. Eis suas palavras: "Passa diante dos nossos olhos, em toda a sua intensidade, a cena da agonia no Horto das Oliveiras.
Oprimido ao pressentir a prova que O espera, Jesus, sozinho com Deus, invoca-O com a sua habitual e terna expressão de confidência: ""Abba, Pai"". Pede-Lhe para que, se for possível, afaste d"Ele o cálice do sofrimento (cf. Mc 14,36); mas, o Pai parece não querer atender a voz do Filho.
Para transmitir ao homem o rosto do Pai, Jesus teve não apenas de assumir o rosto do homem, mas de tomar inclusivamente o ""rosto"" do pecado: ""Aquele que não havia conhecido pecado, Deus O fez pecado por nós para que nos tornássemos n"Ele justiça de Deus"" (2 Cor 5,21). (NMI 25).
A entrada em Jerusalém, sob os aplausos daqueles que o acompanhavam e das crianças, montado em um jumentinho, de um lado revelava a esperança de um tempo novo no coração das pessoas e, de outro, a disposição de Jesus de entregar sua vida pela salvação da humanidade.
Entrou em Jerusalém como um rei humilde, portador da paz. Só mais tarde, com a vinda do Espírito Santo, os discípulos compreenderam que Cristo deveria assim consumar sua existência histórica e que a verdadeira salvação viria através de suas dores, da entrega de sua vida: "Ele não cometeu pecado algum, mentira nenhuma foi encontrada em sua boca.
Quando injuriado, não retribuía injúrias; atormentado, não ameaçava; antes, colocava sua causa nas mãos daquele que julga com justiça. Carregou nossos pecados em seu próprio corpo, sobre a cruz, a fim de que, mortos para os pecados, vivamos para a justiça. Por suas feridas fostes curados. Andáveis como ovelhas desgarradas, mas agora voltastes ao pastor que cuida de vós"( I Pe 2,22-25). Isaias havia profetizado a seu respeito: "Eram na verdade nossos sofrimentos que ele carregava, eram nossas dores que ele levava às costas... estava sendo transpassado por causa de nossas rebeldias, estava sendo esmagado por nossos pecados... com seus ferimentos veio a cura para nós... com sua experiência, meu servo, o justo, fará que a multidão se torne justa, pois é ele que carrega os pecados dela...ele estava carregando os pecados da multidão e intercedendo pelos criminosos"( Is 53). São Paulo assim expressou o que Isaias, alguns séculos antes, havia profetizado: "aquele que não conheceu pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nos tornemos justiça de Deus"(II Cor 5,21).
Meditando sobre a Paixão e morte de Jesus, somos convidados a experimentar sua profunda comunhão conosco, quando Ele, passando por dentro de nossas feridas, deixando-se tomar por nosso pecado, veio colher-nos na verdade mais profunda de nosso ser, tal como saímos do pensamento e das mãos de Deus e, ressuscitando, resgatar-nos e introduzir-nos no amor infinito de seu Pai e nosso Pai.
Refletindo sobre esse mistério de infinita solidariedade, São Paulo afirma: "Com efeito, quando éramos ainda fracos, foi então, no devido tempo, que Cristo morreu pelos iníquos. Dificilmente alguém morrerá por um justo; por uma pessoa muito boa, talvez alguém se anime a morrer.
Pois bem, a prova de que Deus nos ama é que Cristo morreu por nós quando éramos pecadores" (Rom 5,6-8). A morte de Cristo não foi apenas um exemplo de doação a ser seguido, ela é causa de nossa salvação. Há aqueles que querem ver na morte de Cristo apenas seu significado político. É muito pouco, embora se possa lê-la também sob esse aspecto. Só terá entrado em seu significado profundo aquele que puder repetir com São Paulo: "Minha vida na carne, eu a vivo na fé, crendo no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim". Sim, é preciso experimentar a morte de Cristo como sua entrega "por mim" e se deixar tocar e comover por tão grande gesto de amor e começar a viver para Ele que por nós morreu. Se assim fizermos, ressuscitaremos com Ele para a plenitude da vida sem fim.
Vivamos a Semana Santa na meditação, abertos para a graça do Senhor que vem ao nosso encontro para abrir-nos as portas da vida!
Por Dom Eduardo Benes Sales Rodrigues
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