SEGURANÇA PÚBLICA

MS é o maior corredor do tráfico da América Latina; União é omissa

Com volume de apreensões batendo recordes nacionais, o Estado de Mato Grosso do Sul já é considerado o maior corredor do tráfico de drogas, não só do Brasil, mas de toda a América Latina, tanto para receber entorpecentes quanto para envia-los para Europa e Estados Unidos. Porém, enquanto o narcotráfico utiliza a fronteira sul-mato-grossense como porta de entrada, a União se mostra omissa, com suas forças policais totalmente sucateadas, fazendo com que o Estado assuma uma responsabilidade que deveria ser do Governo Federal.

A afirmação é do secretário de Segurança Pública de Mato Grosso do Sul, José Carlos Barbosa, o Barbosinha, que ganhou repercussão nacional na última semana no portal Uol e jornal Folha de São Paulo. Na oportunidade ele ressaltou, inclusive, que o narcotráfico na fronteira de MS sustenta violência no Rio de Janeiro, estado que vive em situação de guerra na disputa das facções pelo comando do tráfico e contrabando de armas.

Ao O PROGRESSO, o secretário afirmou que assunto tomou tamanha repercussão porque antes ninguém discutia fronteira, situação que mudou quando ele assumiu o cargo. "Tenho alertado que hoje o que abastece o crime organizado no Rio de Janeiro, por exemplo, é com certeza o tráfico que passa fartamente por nossa fronteira. Só se vence uma guerra cortando o suprimento e as forças policiais estaduais estão empenhadas nisso, mas ainda falta a União fazer sua parte. O corredor do tráfico é tão expressivo na nossa região, que no ano passado foram apreendidos 297 mil quilos de drogas. Esse ano até setembro, as apreensões pelas policias estaduais já tinham superado a casa dos 350 mil quilos", destaca.

Segundo Barbosinha, em um momento em que existe um aumento violento nas apreensões de entorpecentes no Estado, é exatamente o momento em que se vê um processo de sucateamento da Polícia Rodoviária Federal e da falta de concursos para a Polícia Federal. "A União precisa assumir a responsabilidade dela. Os postos da Polícia Rodoviária Federal estão todos praticamente sem funcionamento. falta efetivo para as abordagens, faltam recursos e isso faz que que os postos fiquem desguarnecidos. O mesmo ocorre com a Polícia Federal. Isso faz com que o Estado tenha que cuidar de narcotráfico, quando essa responsabilidade é da União. Nós deveríamos estar atuando em regime de colaboração, mas atuamos como agente princi", destaca.

União

Segundo Barbosinha, o que ele recebe de resposta quando ele cobra presença da União na fronteira é que a Secretaria Nacional de Segurança Pública tem uma estrutura pequena e enfrenta dificuldades para ajudar os estados, que acabam tomando para si a responsabilidade de coibir o narcotráfico. "O grande problema é que os estados não estão aguentando mais essa carga. Em Mato Grosso do Sul, o governador Reinaldo Azambuja lançou o MS Mais Seguro, programa que vem mostrando resultados positivos como a redução de 66% de latrocínio, 27% de homicídios. Apesar disso, sem o apoio do governo federal, chega um momento em que o Estado terá que parar desfazer esse papel da União e isso se tornaria um caos. Por outro lado, se a União dota a PRF e PF de orçamento e efetivo e assume os presos federais, ela libera o Estado para cuidar de roubos, furtos, homicídios, entre outros crimes de responsabilidade do Estado. Narcotráfico é responsabilidade da União não do Estado", conclui.

Estado de MS perde R$ 616 milhões com presos federais

Como se não bastasse a falta de apoio para coibir o narcotráfico, o Governo Federal ainda deixa nas "mãos" do Estado o papel de custear os presos federais. De acordo com o secretário de Segurança Pública José Carlos Barbosa, são R$ 130 milhões, o valor que o Estado gasta custando esses detentos nos presídios Estaduais.

Para reverter essa situação, o Governo de Mato Grosso do Sul ajuizou ação civil pública com pedido de liminar no Supremo Tribunal Federal contra a União cobrando o ressarcimento de R$ 616,5 milhões, que correspondem às despesas assumidas pelo Estado nos últimos cinco anos para custear os presos federais nos presídios locais.

Atualmente, mais de 40% da massa carcerária estadual – 7.246 condenados ou em regime provisório – são de criminosos envolvidos em tráfico de drogas e armas, cuja manutenção é de competência do governo federal, segundo Barbosinha.

Segundo ele, desde que assumiu a chefia do Executivo Estadual, o governador Reinaldo Azambuja tem cobrado insistentemente a responsabilidade constitucional da União sobre a guarda dos presos federais. Além de comprometer as finanças do Estado com uma despesa mensal de R$ 10,6 milhões, estes sentenciados ainda incidem na superlotação das unidades prisionais em mais de 80% do excedente (8.897 detentos), gerando crise e insegurança no sistema penitenciário e a necessidade de investimentos na construção de novos presídios.

Sem respostas

Para o secretário, a medida judicial é pertinente porque a União não sinalizou nenhuma posição às cobranças feitas desde 2015 pelo seu governo. "A sociedade sul-mato-grossense está pagando um preço alto por um custo que não é nosso", disse. "Ou a União assume seus presos ou construa um presídio para abrigá-los, o que não podemos aceitar é o Estado arcar com essa despesa e ainda com o impacto na superlotação dos nossos presídios com a presença desses criminosos transnacionais".

A ação ajuizada pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE) ante a postura indiferente e omissa da União, segundo o governador, visa resguardar ao Estado a garantia de destinar prioritariamente os recursos hoje canalizados para manter esse contingente de sentenciados federais na reestruturação da segurança pública e melhoria do sistema prisional. Reinaldo também cobra da União o controle dos 1.500 quilômetros de fronteira de Mato Grosso do Sul com o Paraguai e a Bolívia.

"Qualquer país no mundo protege suas fronteiras, menos o Brasil, que não prioriza os seus limites internacionais", criticou recentemente o governador Reinaldo Azambuja. "A fronteira aberta, grande parte dela seca com os nossos vizinhos, deixa em Mato Grosso do Sul não apenas a droga, mas, o preso por tráfico internacional, que hoje lota os nossos presídios e impacta nosso custeio", acrescentou. "E todo o ônus da vigilância, combate e custódia desses presos recai sobre os ombros do Estado".

Custo por preso

Conforme a ação, o custo médio mensal dos presos federais para o Estado, no ano passado, foi de R$ 1.581,90, cuja atualização monetária em fevereiro deste ano fixa o valor de R$ 1.633,57. No entanto, o custo real, segundo levantamento da Procuradoria-Geral, incide sobre a superlotação de 16.224 presos para 7.327 vagas, e chega a R$ 3.617,29 por interno – superior a média nacional, de R$ 2,4 mil. Com base nesse cálculo, a PGE ajuizou a ação requerendo o ressarcimento da União no valor de R$ 10.616.571,43/mês.

Na ação de 26 páginas, a procuradoria questiona também o fato de o Estado praticamente assumir, por décadas, o controle e fiscalização das fronteiras com o Paraguai e a Bolívia, onde, diuturnamente, ocorrem apreensões de drogas e armas. Em 2016, a polícia estadual apreendeu 296,8 toneladas de drogas, além da prisão dos traficantes, cujas operações também oneram os cofres públicos. Nos últimos cinco anos, o volume de drogas apreendidas foi de 977 toneladas.

Para o procurador-geral do Estado, Adalberto Neves de Miranda, "neste panorama perturbador" gerado pelo descaso da União quanto a não contrapartida no custeio dos presos, o Estado "atua como verdadeiro escudo para as demais unidades da Federação". Citou que o Estado despende de seus recursos orçamentários e esforço do sistema de segurança pública para o combate ao tráfico de drogas, armas e munições e ainda assume sozinho a manutenção desses internos.

"Muito se tem debatido em torno da crise carcerária no País – observa -, com a conta recaindo sobre o orçamento estadual, advindo daí as dificuldades de promoção da melhora na condição de todos os detentos nas unidades prisionais de Mato Grosso do Sul". Adalberto Miranda afirma que esse ônus prejudica a tutela dos direitos fundamentais coletivos dos presos provisórios ou definitivos, segregados no sistema prisional estadual.

"Como indeclinável consequência dessa circunstância tem-se o aumento exponencial das massas carcerária e penitenciária submetidos à responsabilidade e custeio do Estado, superlotando suas unidades prisionais a números alarmantes", argumenta o procurador. Ele cita que o aumento da população carcerária "impõe ainda ao governo estadual a obrigação de realizar concursos públicos na área policial e ampliar o sistema prisional às suas expensas".

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