Pela primeira vez na história do Exército Brasileiro, as mulheres terão a oportunidade de chegar a patente de general e até mesmo comandar tropas. A medida é possível com a chegada de 33 alunas à Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em fevereiro desse ano, depois de passarem pela Escola Preparatória de Cadetes do Exército em concurso inédito com vagas para mulheres. Agora elas também poderão ter treinamento na linha bélica.
Em Dourados, 27 militares femininas fazem parte da 4º Brigada de Cavalaria Mecanizada -Brigada Guaicurus, atuando diariamente com cerca de 900 homens. Elas são em 17 temporárias e 10 de carreira.
No Dia Internacional da Mulher, elas comentam sobre a carreira e as experiências de conviver num universo praticamente masculino. Sobre a novidade da mulher poder ingressar na linha de frente de combate e ter a chance de se tornar comandante, a major mais antiga da instituição, Sayonara Neves Bravo, disse que são novos desafios físicos e até psicológicos que as alunas terão que enfrentar. apesar disso, ela acredita que darão conta do recado. "O treinamento é puxado e será igual para homens e mulheres com estruturas físicas e necessidades diferentes. Creio que não será facil, mas não impossível", destaca.
Médica por formação e chefe do Posto Médico, Sayonara disse que a história dela com as forças armadas vem de longa data, muito antes de se integrar. "Meu pai era militar. Eu me formei médica e depois de anos atuando na profissão, com três carteiras assinadas, larguei tudo para fazer carreira militar. Passei com cargo temporário e posteriormente como profissional de carreira. Fiz meu pai chorar de alegria, pois eu nunca havia dito que queria ser militar e foi uma grande surpresa. Posso dizer que tudo o que eu tenho, e o que sou é graças ao Exército", contou emocionada.
Em relação a sua carreira militar ela disse que hoje se sente realizada. "No começo, há mais de 20 anos era mais notável o preconceito de homens, não da instituição, em relação a uma mulher numa patente superior. Por isso muitas vezes vi militares homens atravessando a rua para não ter que me cumprimentar com a continência, pelo fato de eu ser mulher. Hoje a gente não vê mais isso porque culturalmente as pessoas estão evoluindo. A postura da militar também é muito importante nesse meio e o que vai garantir esse respeito que tanto buscamos e ascensão profissional que desejamos. Hoje, depois de ter vivido muitas experiências aqui, posso dizer que tudo valeu muito a pena. Faria tudo novamente e o melhor, me sindo realizada e feliz", conta.
A major Marise Simões Pinho tem literalmente uma história de amor com o Exército. "Primeira-dama", ela é a esposa do general Lourenço William da Silva Ribeiro Pinho e uma das raras esposas de general que também segue a carreira militar. Veterinária de profissão, ela decidiu parar o trabalho no meio civil, depois de 11 anos para acompanhar o marido militar nas transferências habituais da profissão. "Lembro como hoje eu estudando com a minha filhinha de um aninho no colo e ela brincando de rabiscar as apostilas. Posso assegurar que ingressar na carreira militar não foi fácil, mas tudo o que vivi foi muito gratificante para mim. Sou feliz em casa, como mulher e na profissão", comemora hoje atuando na administração do posto médico.
A 1º tenente Vania Ifrain Sandim Xavier, está no grupamento temporário. Ela, que é advogada e está há 7 meses no Núcleo jurídico da instituição disse que foi recebida de braços abertos. "Eu sempre sonhei em estar no Exército por incentivo dos meus pais. Sempre tive um respeito muito grande pela instituição e pelo amor que ela demonstra a Nação. Por isso quando tive a oportunidade de estar aqui, vim de peito e coração abertos", conta.
A 3ºsargento Jarci Cavanha de Freitas Crespan atua no setor financeiro do Exército. Segundo ela, o que chamou a atenção ao ingressar na instituição, é o respeito e o tratamento igualitário que o Exército demonstra e ensina diariamente. "Todo o trabalho, desde a pré-seleção que é rigorosa para todos, é feito sem tratamento privilegiado. Ninguém faz mais nem menos que o outro. O respeito a hierarquia também é algo que aprendemos desde cedo aqui e que levamos para a vida toda", observa.
A 1º tenente Juliana Pereira Gamba Corrêa é veterinária. Além de "abraçar" o Exército ela "abraçou" Dourados. "Vim de Birigui, no Estado de São Paulo para fazer o processo de seleção em Dourados. Larguei minha família lá e vim sozinha para uma cidade desconhecida por mim. Foi uma mudança difícil porque deixar todo mundo que a gante ama a 600 quilômetros de distância exige muita força de vontade. No entanto, foi em Dourados que eu constitui a minha família. casei e hoje tenho um filho. Como recém formada em Veterinária tive a oportunidade de fazer na prática tudo aquilo que vi na Faculdade. Também pude cuidar dos equinos utilizados pelo Exército o que foi motivo de muita alegria, já que tenho uma verdadeira paixão por esses animais, desde os tempos de menina nas fazendas da minha família. Estar no Exército para mim foi uma grande oportunidade de ascenção na carreira e na vida, já que esses valores que aqui aprendi levarei para sempre comigo", destaca, observando que se um dia tiver a chance vai incentivar o filho a seguir carreira militar.
O coronel Wenderson Batista Santana diz que está otimista em relação aos espaços conquistados pelas mulheres no Exército. "A dedicação que demonstram e por serem mais detalhistas elas têm contribuído muito com a instituição, nas mais variadas funções que exercem", explica.
Longa jornada
Hoje, as muheres podem ingressar voluntariamente no Exército como militar de carreira ou temporário, mas não podiam seguir no Quadro de Material Bélico ou no Serviço de Intendência. A mudança só se tornou possível graças à Lei nº 12.705, sancionada em 2012 pela Presidência da República, permitindo que militares do sexo feminino atuem como combatentes do Exército Brasileiro em áreas antes restritas aos homens. Com a lei a Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx) abriu vagas para mulheres em concurso em 2016. Desse ano, essas militares foram recebidas na Aman e tem uma longa etapa pela frente se quiserem se tornar generais. Como alunas, elas serão oficiais do Exército em 2021 e, a partir daí precisarão chegar às patentes de 2º tenente, 1º tenente, capitã, major, tenente coronel, coronel, general de brigada, general de divisão, general de Exército e, só depois, comandante do Exército. Hoje em dia uma turma só pode disputar uma promoção de generalato depois de 30 anos de formado. E, quando se torna general, é preciso estudar por mais 12 anos. E só o general de Exército pode concorrer para ser um comandante do exército.
Primeira Mulher
A primeira participação de uma mulher em combate ocorreu em 1823. Maria Quitéria de Jesus lutou pela manutenção da independência do Brasil, sendo considerada a primeira mulher a assentar praça em uma Unidade Militar. Entretanto, somente em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial, as mulheres oficialmente ingressaram no Exército Brasileiro.
Foram enviadas 73 enfermeiras, 67 delas enfermeiras hospitalares e 6 especialistas em transporte aéreo. Elas serviram em quatro diferentes hospitais do exército norte-americano, todas se voluntariaram para a missão e foram as primeiras mulheres a ingressar no serviço ativo das forças armadas brasileiras.
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