“Toquei a música que fiz para o meu filho, uma dos Beatles, outra em alemão - já que o Dr. Michel fala alemão. E uma sertaneja, atendendo a pedidos”. É com naturalidade que o catarinense Anthony Kulkamp Dias fala da escolha do repertório de músicas que tocou ao violão enquanto era submetido a uma cirurgia no cérebro. A operação foi feita na última quinta-feira (28), em Tubarão, no Sul do estado.
A equipe médica sugeriu que ele tocasse durante a cirurgia (veja o vídeo) para garantir que nenhuma das funções necessárias, como fala e coordenação motora, seriam afetadas durante o procedimento. “Os médicos pediram para eu repetir a música sertaneja (“Telefone mudo”) duas vezes. Então teve até bis", brinca Anthony, de 33 anos. Ele tem previsão de receber alta nesta quarta (3).
Natural de Braço do Norte, Anthony descobriu um tumor cerebral 15 dias depois do nascimento do filho, Emanuel. “Eu estava conversado com um tio e não consegui falar o nome do meu carro, travou. E na mesma semana eu tinha gaguejado. Fomos ao médico e descobrimos”, conta.
Hoje bancário, Anthony tocou profissionalmente durante 20 anos, e agora vê a música como um hobby – além do violão, ele toca acordeom, teclado, trombone, trompete e flauta doce.
'Mão estava um pouco fraca'
Durante a cirurgia, Anthony intercalava as músicas com períodos de descanso, conforme orientação da equipe médica. Em alguns momentos, o médico anestesista o ajudava com o peso do violão.
Deitado e com um lençol azul na parte superior na cabeça, ele apoiou o violão sobre o tórax e manteve a equipe médica alerta sobre o 'limite' da cirurgia, que durou nove horas no Hospital Nossa Senhora da Conceição.
“Toquei seis músicas em determinados momentos. A mão do lado direito estava um pouco fraca por causa do lado onde eles estavam mexendo. Então eu parava e descansava. Fui intercalando as músicas e conversando com eles.”
Chances de lesão
O anestesista Jean Abreu Machado explica que, geralmente, neurocirurgias são realizadas com o paciente sob anestesia geral e ausência de dor, mas quando o tumor está próximo a áreas como a da fala e movimentação, há risco de perda das funções, caso elas sejam lesadas durante o procedimento. Por isso, é importante manter o paciente acordado.
“As áreas com funções especiais podem ser monitoradas em tempo real. Assim, são menores as chances de lesão e é possível uma otimização do tratamento”, explica o anestesista.
Anthony diz que 90% do tumor foi retirado na cirurgia e que não sentiu dor. Ele espera que o vídeo com o “show” durante a operação sirva de inspiração. “Acredito inclusive que isso tudo tenha sido programado, de ter atingido justamente uma área onde tenho meu dom. Deus me deu esse dom para auxiliar na recuperação e fazer a cirurgia com todo sucesso”, diz Anthony.
Situação inédita
Essa foi a 19ª cirurgia com monitoração cerebral realizada pelo hospital e a primeira onde o paciente tocou. O hospital é o único no estado a fazer este tipo de cirurgia. O procedimento foi coberto por convênio, mas conforme a assessoria de imprensa do hospital, geralmente elas são realizadas através do Sistema Único de Saúde (SUS).
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