Antes de escolher o emprego dos sonhos, o caminhoneiro Flávio José Raimundo, de 39 anos, já sabia onde queria chegar. O sonho de infância era ter a própria carreta, para que pudesse seguir a profissão do pai e transformar a vida da família com o pé na estrada. Depois de algum tempo como empregado, a busca deu certo e ele trocou a casa própria por um caminhão para recomeçar a trajetória como "patrão".
Sua história chegou ao Lado B após um sorteio para a primeira Copa Truck realizada pela primeira vez em Campo Grande, no último fim de semana. A família narrou a loucura que foi capaz de fazer para um sonho e a reportagem deu cara o amor deles pela profissão do pai, sem nenhum medo de encarar mudanças.
"Eu gostava do meu antigo serviço, tinha um patrão muito gente boa, mas aquele não era meu emprego dos sonhos. Eu queria mais, me espelhava muito no meu pai", lembra Flávio do tempo que atuou como operador de guindaste.
Mesmo assim ele não desanimou e logo conversou com a esposa Maria Luiza da Silva, de 42 anos, para juntar dinheiro e comprar a carreta que poderia transformar a vida da família.
Mas a mudança foi mais radical. Depois de perder o pai, Maria Luíza mudou-se para a casa da mãe e viu na casa própria a chance de investir em um sonho para que toda a família se orgulhasse. "A gente conversou e viu que podia vender a casa ou trocar por um caminhão. Assim ele sairia do emprego, viajaria o Brasil com o próprio veículo e aumentaria a renda da família", conta Maria.
Ao lado da filha Anna Flávia da Silva Raimundo, de 17, pai e mãe conversaram sobre a possibilidade. A decisão foi unânime e os três decidiram trocar a residência avaliada em R$ 150 mil por uma carreta. Com o negócio fechado, recomeçaram sem medo, mesmo após ouvir de todo mundo que aquela foi maior loucura feita na vida.
"Nossa, teve muito mais gente que me chamou de louco do que apoiou. Mas eu sabia o quanto isso ia me fazer feliz e trazer felicidade para nossa família, principalmente, porque eu não estava sozinho. Tenho as duas do meu lado".
Como a residência o emprego fixo foram removidos da rotina, Flávio passou a pegar intensamente a estrada, mas com prudência garante. "Faço duas viagens somente por semana. Até poderia fazer mais, no entanto teria que ficar sem dormir e isso é perigoso. Toda vez que eu saio para viajar, deixo minha família e meu objetivo é voltar".
E o que mudou? A pergunta já foi feita inúmeras vezes à família que, diariamente, é questionada sobre o quanto vale se arriscar. O sorriso de Flávio e Maria são respostas prontas. "Agora a gente começou a viver. Depois de oito anos, eu e minha esposa conseguimos tirar férias juntos e curtir a praia. Sabe o que é ficar tanto tempo sem curtir a família? Pois é, agora a gente consegue", descreve Flávio.
A profissão fica menos desgastante com apoio e parceria da família. Todo mês, Maria é quem sobe no caminhão e acompanha Flávio nas viagens. O caminho até parece mais curto, diz ele. "A gente vai conversando, conhecendo os lugares e ao mesmo tempo se divertindo na estrada. É uma companhia que faz a gente trabalhar com amor".
Aos 17 anos, Anna é puro orgulho do pai. "Eu não canso de falar do amor dele pela profissão e eu fico muito orgulhosa, porque sei que é um trabalho difícil, mas ele faz tudo pela gente e sempre volta cheio de saudade. Se é sonho dele, é o nosso sonho também".
O plano agora é pegar muito estrada para comprar uma nova casa, em seguida outra carreta. "Hoje sou meu patrão, então preciso trabalhar muito pra isso. Mas nos próximos anos sei que a gente vai estar de casa nova".
A carreta tem toda estrutura que a família precisa para pegar a estrada. "Tem colchão, fogão e logo logo vou instalar a geladeira. Sempre que a gente viaja, ficamos muito confortáveis", diz Flávio.
Se a troca valeu a pena? Ele não dúvidas. "As pessoas tem medo de mudar de vida. Mas nem sempre a mudança é pelo caminho mais fácil. Quem olha de fora acha que a gente abriu mão de um bem, mas na verdade foi investimento, por uma coisa que é nossa e que vai nos ajudar a crescer".
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