O TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) revogou a decisão da 6ª Vara Cível de Dourados que determinava ao policial militar Dijavan Batista dos Santos, de 40 anos, o pagamento de pensão mensal a familiares do bioquímico Julio Cesar Cerveira Filho, assassinado por ele aos 43 anos, com disparo de arma de fogo efetuado dentro de uma sala de cinema ocupada por dezenas de crianças na tarde de 8 de julho 2019.
Os pagamentos haviam sido ordenados pelo juiz José Domingues Filho no dia 9 de julho deste ano, ao deferir em parte o requerimento autoral formulado em tutela de urgência no processo com pedido de indenização por danos morais contra o cabo da Polícia Militar e o Estado.
À época, o magistrado estabeleceu o pensionamento por morte no valor correspondente a 2/3 de R$ 3.094,88, conforme entendimento fixado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), definindo ainda que o montante seja rateado entre as autoras na proporção de 50% para cada uma.
“No tocante a autora-filha, esse direito se manterá até completar 18 anos, ou 24 anos se estiver cursando universidade. Encerrado para ela, o valor será acrescido ao da autora-viúva, que perceberá o valor até completar 75 anos”, definiu o juiz de 1ª instância.
Contudo, Dijavan impetrou agravo de instrumento no TJ e durante sessão de julgamento realizada no dia 16 passado, a 4ª Câmara Cível da Corte estadual deu provimento ao recurso para revogar a tutela de urgência concedida pela 6ª Vara Cível de Dourados.
No julgamento, o desembargador Júlio Roberto Siqueira Cardoso e o juiz Luiz Antônio Cavassa de Almeida acompanharam o voto do relator, desembargador Vladimir Abreu da Silva, para quem “os elementos relativos ao sinistro deverão ser analisados no feito para eventual configuração da culpa da parte ré/agravante pelo evento, sendo, então, indevida a fixação de valor a ser pago pela parte ré já nesse estágio inicial da lide, em que a cognição é sumária”.
“Em que pese a terrível situação narrada pelos agravados, os elementos coligidos aos autos são insuficientes para a manutenção da medida. De fato, em análise perfunctória, mostra-se prematura a concessão da tutela, sem o devido processo legal, em respeito ao contraditório e à ampla defesa, pois somente com o aprofundamento da cognição se poderá elucidar os fatos. Ademais, observa-se, da simples visualização dos holerites do agravante que o valor arbitrado é incompatível com sua renda. Assim, mostra-se conveniente aguardar a regular dilação probatória a fim de se afirmar em que circunstância se deu a morte da vítima na petição inicial, bem como a quem deve ser atribuída a responsabilidade pelo evento”, pontuou o responsável pela relatoria.
Porém, embora tenha considerado que “à vista dos parcos elementos presentes na inicial, carece a pretensão das agravadas do preenchimento do requisito da probabilidade do direito para a obtenção da tutela antecipada”, o desembargador ponderou que isso não constitui “qualquer óbice a que o mesmo seja observado em um momento posterior do feito, após a sua instrução”.
Agressão injusta
No recurso ao TJ, Dijavan alegou possuir filhos aos quais paga alimentos no valor de R$ 600,00 a cada um, sobrando-lhe o valor líquido de R$ 1.968,71, razão pela qual a determinação da 6ª Vara Cível de Dourados lhe trará “prejuízos de difícil reparação e a demora do processamento agravará o prejuízo”.
Ao afirmar que o magistrado já lhe atribuiu sua culpa pelos fatos, o policial militar diz não ter agido com agressividade, “somente repelindo agressão injusta atual e/ou iminente de pessoa bem maior e mais forte”.
A defesa mencionou ainda “diversos depoimentos trazidos como prova emprestada” para confirmar a situação, “que, inclusive, lhe gerou lesões e a seu filho; tratando-se de legítima defesa e culpa exclusiva da vítima”.
“Não bastassem os depoimentos, a própria perícia realizada no processo criminal, confirma a tese de que o acionamento do gatilho ocorreu pelo fato de a vítima ter puxado a arma para seu peito, tentando tomá-la do agravante, eis que mesmo tendo se identificado como policial a vítima não cessou seu ataque”, descreve o relatório do voto.
Outra alegação da defesa sustenta que embora Dijavan tenha participado da ação que ceifou a vida do pai e esposo das agravadas, “não agiu ao arrepio da lei, o que não foi observado pelo magistrado ao deferir o pedido de tutela antecipada, ou seja, não buscou analisar a possibilidade da exclusão de ilicitude dos fatos narrados pela autoras; que por sinal, foram gravemente deturpados da realidade dos fatos ocorridos”.
Novamente, mencionou documentos e depoimentos em anexo aos autos nos quais “pode-se verificar que o agravante fugiu da confusão arrumada pela vítima, somente sacando sua arma e se identificando como policial quando a situação não era mais sustentável; mesmo assim a vítima não cessou sua injusta agressão tentando tomar a arma”.
Outro argumento apresentado pela defesa do policial militar “destaca que a lógica aplicada ao Estado de Mato Grosso do Sul é diversa da que lhe foi aplicada, uma vez que a dúvida, com relação ao Estado prestar alimentos, afastou a probabilidade do direito”.
“Mas a dúvida sobre a culpa em relação ao agravante, diga-se, apesar da farta demonstração de culpa da vítima para o deslinde da fatalidade, sequer foi considerada. Assim, dado que sequer foi cogitada a responsabilidade do Estado, a mesma decisão deveria ser em relação ao recorrente”, argumentou o advogado Victor Jorge Matos para justificar o pedido de revogação da tutela de urgência concedida na 6ª Vara Cível de Dourados.
Homicídio qualificado
Pelo assassinato cometido no cinema, Dijavan é réu na Ação Penal de Competência do Júri número 0008402-93.2019.8.12.0002, que tramita sob sigilo na 3ª Vara Criminal da comarca com acusação de homicídio qualificado.
Na Justiça Militar, ele foi condenado em agosto deste ano por posse de armas irregulares porque, conforme a sentença, mantinha na própria casa armas e munições, dentre elas um revólver Smith & Wesson calibre .22, uma espingarda calibre 36, de marca e modelo desconhecido, ambos os armamentos ilegais, além de 33 munições de origem estrangeiras, também ilegais, na mesma época em que assassinou o bioquímico Julio Cesar Cerveira Filho.
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