Em pouco menos de um mês, líderes mundiais se encontrarão em Paris para tentar entrar em acordo sobre ações contra as mudanças climáticas e o aumento da temperatura global. Uma das principais preocupações é que o aquecimento global afete safras de alimentos.
Para garantir que plantas sobrevivam aos piores cenários possíveis, amostras de sementes estão sendo reunidas no chamado Silo Global (ou Internacional) de Sementes – um armazém nas ilhas Svalbard, no Ártico. A BBC teve acesso ao interior do local. Confira o depoimento do repórter David Shukman:
"Chegar ao que supostamente é o lugar mais seguro do planeta dá uma sensação amedrontadora. No topo de uma montanha no Ártico, em meio à ventania, uma porta de concreto leva ao Silo Global de Sementes Svalbard, construído para assegurar a sobrevivência das plantas mais valiosas do mundo.
Criado para suportar as condições mais pessimistas de um apocalipse, o lugar faz com que os visitantes não se sintam muito bem.
A primeira barreira para chegar lá é a localização absolutamente remota – as ilhas Svalbard ficam a apenas 1.300 km no Polo Norte.
E, apesar das muitas luzes vindas da Noruega, e do aumento da popularidade de aventuras no Ártico, a população no local é esparsa e o turismo de massa ainda não é uma opção.
Há ainda um perigo não planejado: uma lâmina de gelo duro cobre o pequeno estacionamento do local. Cada passo dado pode ser traiçoeiro.
As chaves do reino A porta externa é feita de aço, mas pode ser aberta com uma chave surpreendentemente comum – do tipo que a maioria de nós usa em casa.
Os primeiros passos nos tiram do vento cortante e nos levam a uma atmosfera de extrema quietude. Um conjunto de capacetes de segurança está esperando para ser usado.
Outra porta se abre para um túnel que suavemente desce mais profundamente dentro da montanha. A temperatura é -4ºC e agora estamos no "permafrost" – solo que nunca descongela.
A maior parte do túnel é forrada de concreto, mas mais para dentro as paredes de rocha estão expostas. Nossas vozes começam a ter eco.
O conceito do projeto é simples: imaginar tudo o que pode dar errado com as principais lavouras do mundo e assegurar que amostras delas fiquem intocadas aqui.
Por isso, a entrada do lugar fica 130 metros acima do nível do mar – uma distância confortavelmente acima das piores projeções do quanto os oceanos podem subir caso haja um derretimento total das calotas polares nos próximos séculos.
Ser esculpido na rocha também deve garantir que as sementes sejam imunes à guerra. Svalbard fica bem distante de qualquer conflito militar, mas digamos que um deles exploda no Ártico – o que não é totalmente inconcebível – e que uma arma aleatória chegue até lá. Em teoria, ela não deveria conseguir passar. [O túnel principal do silo se estente por 115 metros dentro da montanha (Foto: BBC)]
Os primeiros passos nos tiram do vento cortante e nos levam a uma atmosfera de extrema quietude. Um conjunto de capacetes de segurança está esperando para ser usado. Outra porta se abre para um túnel que suavemente desce mais profundamente dentro da montanha. A temperatura é -4ºC e agora estamos no "permafrost" – solo que nunca descongela.
A maior parte do túnel é forrada de concreto, mas mais para dentro as paredes de rocha estão expostas. Nossas vozes começam a ter eco. O conceito do projeto é simples: imaginar tudo o que pode dar errado com as principais lavouras do mundo e assegurar que amostras delas fiquem intocadas aqui.
Por isso, a entrada do lugar fica 130 metros acima do nível do mar – uma distância confortavelmente acima das piores projeções do quanto os oceanos podem subir caso haja um derretimento total das calotas polares nos próximos séculos.
Ser esculpido na rocha também deve garantir que as sementes sejam imunes à guerra. Svalbard fica bem distante de qualquer conflito militar, mas digamos que um deles exploda no Ártico – o que não é totalmente inconcebível – e que uma arma aleatória chegue até lá. Em teoria, ela não deveria conseguir passar.
Chegamos a outra porta, sobre a qual há uma fina camada de gelo. A temperatura está caindo. Passar por ela nos leva a um lugar chamado "a catedral", uma vasta caverna que dá acesso aos silos de sementes propriamente ditos.
Sobre nós estão os canos prateados do sistema de resfriamento e cristais de gelo cintilam nas paredes rochosas.
Caixas da Coreia do Norte Há mais uma porta à frente, que está incrustada no gelo. O ar ali dentro é mantido há -18ºC. Estamos protegidos contra o frio por nossas roupas, mas qualquer pedaço de pele exposta fica gelado rapidamente e minha caneta para de funcionar quase imediatamente. Gravamos vídeos o mais rápido que podemos. O armazém tem filas de prateleiras, cada uma delas cheia de grandes caixas de plástico do tipo que você usa para guardar arquivos dentro de casa. Dentro delas há pequenos pacotes que contêm as sementes. São mais de 865 mil pacotes no total, representando mais de 5 mil espécies e quase a metade das lavouras mais importantes do mundo.
As etiquetas são fascinantes – há sementes da África, da Ásia e das Américas. Há, inclusive, caixas da Coreia do Norte. Mas a história mais emocionante é a que está por trás das caixas plásticas da Síria. Havia um centro regional de pesquisas de agricultura em áreas secas em Aleppo. Mas cortes de energia constantes e a guerra civil, que teve início em 2011, impediram a continuidade do trabalho. Por causa disso, as sementes fizeram uma longa jornada até aqui.
Esse é exatamente o propósito deste lugar. A maior parte dos países têm seus próprios armazéns das variedades de plantas mais importantes, mas o Silo Global de Sementes foi feito para funcionar como uma alternativa a estas alternativas.
O lugar começa a fazer sentido quando você pensa em locais onde enchentes ameaçam silos de sementes nacionais; onde a agricultura de escala industrial reduziu tanto a variação genética que pragas podem ser catastróficas; onde projeções para mudanças climáticas ameaçam suprimentos de alimentos. No início deste mês – muito antes do que se esperava – veio o primeiro exemplo de que o cofre está realmente fazendo seu trabalho.
Algumas das sementes sírias, incluindo variedades antigas e possivelmente resistentes de trigo, cevada e grão-de-bico, foram retiradas das prateleiras congeladas porque são necessárias no Oriente Médio. No total, 128 caixas – de um total de 350 enviadas originalmente de Aleppo – foram levadas de volta, para serem usadas no Líbano e no Marrocos.
As sementes derivam de plantas cultivadas em alguns dos primeiros exemplos de agricultura no Crescente Fértil – região que engloba Palestina, Israel, Jordânia, Kuwait, Líbano, Chipre e partes da Síria, do Iraque, do Egito, do sudeste da Turquia e sudoeste do Irã. Agora, elas serão plantadas para produzir duplicatas. Em breve, haverá agricultores no Oriente Médio cujas lavouras do futuro poderão render mais ou ser mais resistentes à seca, porque pacotes de sementes foram guardados em um bunker nas montanhas solitárias do distante Ártico."
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