“Em questão de horas, tudo na nossa vida mudou. Sonhos, planos, tudo foi embora. Meu filho já estava em coma. Mas ele lutava para viver e hoje é o meu maior presente. Me ensinou que aquele ali é o mundo dele. E no Dia das Mães, assim como todos os dias, meu filho vivo é o maior presente”. O relato é da auxiliar administrativo Samyra Tatiana Saab, de 53 anos, que teve a vida renovada após descobrir um tumor no cérebro do filho há 18 anos.
Samyra reside em Dourados, a 214 quilômetros de Campo Grande. A sua rotina é dividida entre o trabalho e o cuidado com o filho Henrique Rosa, de 30 anos, que vive em estado vegetativo. Ela trabalha em uma universidade e, naquele local, dá lições de vida para muitos acadêmicos e inclusive mães que não enfrentam metade das adversidades vividas por ela.
“Aos 12 anos, o Henrique começou com uma simples dor de cabeça e que se transformou em uma enxaqueca. Os médicos diziam que era um problema hereditário e nenhum deles exigiu um exame mais detalhado na época. Um profissional que o atendeu inclusive disse que a tomografia não tinha necessidade no caso dele, seria em último caso”, afirmou Samyra.
No entanto, o tempo passou e as dores passaram a ser cada vez mais intensas e frequentes. A crise ocorreu no dia 22 de março de 1996. No hospital, os médicos constataram que o então menino estava com um cisto no cérebro. “Aqueles que nos atendiam sabem que, se o problema tivesse sido descoberto antes, ele teria sequelas, mas não tão graves”, explicou a mãe.
Alguns médicos indicaram uma viagem para São Paulo, enquanto outros sequer 'davam esperanças'. “Ele tinha que ter ido em um avião com UTI [Unidade de Terapia Intensiva], por conta da pressão intracraniana, mas não providenciaram nada. Estávamos na Semana Santa e me lembro que, na hora da descida, ele teve uma crise convulsiva e a pressão quase foi a zero”, relembrou.
A equipe médica atendeu a criança ali mesmo, após esvaziar toda a tribulação. “O paramédico pegou a tomografia e constatou que ele estava doente há muito tempo. Já no hospital particular enfrentamos bastante dificuldade. Eu abandonei uma faculdade de direito e o meu marido começou a vender tudo na época, menos a nossa casa”, comentou.
Negligência
No decorrer dos dias, a família aguardava boas notícias, mas o menino continuou entubado por 21 dias. De volta para Mato Grosso do Sul com a doença e uma infecção contraída no hospital, a família continuou a luta. “Continuamos com as viagens para São Paulo e Brasília. Eu briguei muito com os funcionários, principalmente porque a equipe médica que o atendeu no hospital particular também o atendeu no público. Parecia que não tinha amor ao ser humano e as dificuldades foram muitas”, ressaltou Samyra.
Quando a mãe encontrou um amigo de infância, sentiu que a salvação para o filho estava próxima. “Ele se formou médico e nos ajudou muito, retirando o meu filho da enfermaria e prestando o atendimento necessário a ele em um quarto. Foi quando conheci a AACD [Associação de Assistência à Criança Deficiente] e vi que existem muitos Henriques e Tatianas no mundo. Um mundo só deles, diferente do nosso”, explicou.
Novo mundo
O tempo passou e mãe e filho se adaptaram ao novo mundo. O casamento de 23 anos foi desfeito e Samyra vive um amor integral ao filho. “É um mistério, ele perdeu a visão, a fala, mas desenvolveu outros sentidos. Conversamos por um simples olhar e eu o enxergo como um ser humano normal. Sei que ele é feliz e não tenho vergonha nenhuma de nada. Teria sim se ele fosse um bandido, um assassino ou um drogado”, disse.
Para aqueles que reclamam dos problemas, a mãe garante que o filho 'vence uma guerra' diariamente. “Hoje eu é quem dependo dele. Há três anos meu filho não passa por nenhum hospital e por isso nem entro no quarto quando estou triste. Às vezes penso que ele perdeu a juventude, poderia estar formado, casado, mas ele amou tanto a vida que até a aceitação para a doença foi muito grande. É um presente de Deus”, finalizou.
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