SAÚDE DO IDOSO

Suplementos de cálcio elevam o risco cardíaco?

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A prescrição de suplementos de cálcio para prevenir ou tratar doenças ósseas, em especial a osteoporose, tornou-se nos últimos anos conduta comum, principalmente para pacientes acima dos 50 anos. Os comprovados benefícios na manutenção da massa óssea, aliados ao baixo custo, deram ao produto status de principal protetor contra o desgaste ósseo. Além disso, a venda livre faz com que a automedicação seja corriqueira. Como todo medicamento, porém, o consumo indiscriminado pode trazer riscos. No caso dos suplementos de cálcio há evidências de que podem estar associados ao aumento do risco de problemas cardíacos.

O assunto tem sido objeto de avaliações feitas na Europa e nos Estados Unidos, inclusive pelo National Institutes of Health (NIH), a agência de pesquisas médico-científicas do Departamento de Saúde do governo norte-americano. Recentemente o NIH sugeriu, após avaliação de estudos, a existência de aumento de risco cardíaco e outras doenças cardiovasculares em usuários de suplementos de cálcio. Outras análises detectaram aumento de 30% na ocorrência de infartos e outras doenças coronarianas em pacientes que consumiam suplementos de cálcio, independentemente do sexo.

Pesquisadores do Centro Alemão de Pesquisa do Câncer, em Heidelberg, Alemanha, publicaram em 2012 na revista Heart os resultados de estudo no qual seguiram cerca de 24 mil pessoas por mais de uma década. A conclusão foi de que os que tomavam suplementos de cálcio apresentaram 86% a mais de probabilidade de ter tido ataque cardíaco durante o estudo do que os que não faziam uso dele. Em 2011, trabalho publicado no British Medical Journal mostrou que os suplementos conseguiram evitar uma fratura óssea a cada 302 pacientes, mas em contrapartida geraram um problema cardíaco a cada 178.

"A relação entre suplementos de cálcio e aumento do risco cardíaco surgiu incidentalmente, de estudos cujo objetivo principal era avaliar outros desfechos”, diz o dr. Antonio Gabriele Laurinavicius, cardiologista da Unidade de Medicina Preventiva do Einstein. A realização de um estudo clínico exclusivamente desenhado para estabelecer essa relação de forma definitiva é agora inviável por razões éticas (estudos clínicos para comprovar eventuais malefícios de drogas são proibidos).

Causas desconhecidas

As causas da relação entre a ingestão de suplementos de cálcio e o aumento do risco cardíaco são desconhecidas. A suposição de que o cálcio dos suplementos estaria se depositando nas artérias coronárias e contribuindo para sua obstrução pode ser a mais óbvia, mas não é a única e nem a mais importante.

O cálcio exerce um importante papel na execução das funções do coração, especialmente na contração do músculo cardíaco. Ele é necessário para gerar a atividade elétrica que mantém a atividade de contração. Mas alguns estudiosos sugerem que quantidades anormais do mineral ou as obtidas por outros meios que não pela alimentação podem não ser fisiológicas e trazer mais malefícios do que benefícios.

“O efeito nocivo da suplementação de cálcio é dose-dependente e não é observado com o cálcio proveniente da dieta”, explica o dr. Laurinavicius.

Até agora, as análises foram unânimes em destacar que não se observou aumento do risco quando o cálcio é obtido através de alimentos, nem quando há associação entre cálcio e vitamina D – esta sim considerada uma aliada poderosa na redução do risco cardíaco e alvo de numerosos estudos clínicos atualmente em andamento visando comprovar esse benefício.

"Hoje os suplementos mais prescritos são os que associam cálcio e vitamina D", diz a dra. Renata Bonaccorso Lamego, ginecologista do Einstein.

A Ginecologia é uma das especialidades em que a prescrição dos suplementos é mais usual, sobretudo para a prevenção de doenças ósseas em pacientes na pós-menopausa. Sem proteção hormonal, os ossos tendem a se tornar mais frágeis e porosos, o que eleva o risco de fraturas espontâneas e de quedas, que hoje respondem por 70% das mortes acidentais de adultos idosos. Mesmo assim, a obtenção de cálcio através dos alimentos, principalmente leite e seus derivados, ainda é considerada a mais recomendável.

"Cálcio é medicamento e, como tal, precisa ser utilizado com cautela. Sua indicação não pode ser indiscriminada e precisa ser rigorosamente avaliada pelo médico. Sua livre comercialização nos moldes em que ocorre hoje deveria ser objeto de discussões mais aprofundadas", destaca a dra. Renata.

A suposta relação entre suplementos de cálcio e aumento do risco cardíaco vem sendo acompanhada com interesse por especialistas que tratam de doenças cujo esquema terapêutico exige medicamentos que levam à perda da massa óssea, aumentando o risco de fraturas. Portanto, além do reforço para a prática de exercícios, é indicada a prescrição de suplementos para suprir essa necessidade.

"Além dos medicamentos favorecem a redução da massa óssea, essas são doenças inflamatórias, que aumentam o risco de problemas cardíacos, o que obriga a um monitoramento constante dos fatores de risco", explica a dra. Katia Akemi Miyazato Kuruma, reumatologista e clínica geral na Unidade de Medicina Preventiva do Einstein.

Segundo ela, estudos clínicos realizados pelo Women's Health Initiative, ligado ao National Institutes of Health, concluíram que a suplementação não aumentou nem reduziu o risco de doenças cardiovasculares em mulheres na pós-menopausa após sete anos de uso, embora o suplemento analisado tenha sido em associação com vitamina D.

"No caso de algumas doenças reumatológicas, a indicação desses suplementos é recomendada para proteger os pacientes. Além disso, alguns pacientes não conseguem atingir a quantidade necessária de cálcio exclusivamente através de alimentos", destaca a médica. As necessidades diárias de cálcio variam de acordo com a idade. Para adultos acima de 50 anos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda 1.200 miligramas por dia, que podem ser obtidas, por exemplo, com o consumo diário de um litro e meio de leite.

Como a questão dificilmente produzirá um consenso é recomendável que os usuários de suplementos de cálcio, especialmente os que se automedicam, busquem orientação médica. Somente uma avaliação profissional, que leve em conta fatores de risco para fraturas ósseas e para problemas cardíacos – além de outros dados, como a utilização de medicamentos que diminuem a absorção de cálcio pelo organismo – poderá determinar a necessidade ou não de se lançar mão dos suplementos.

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